Àquela altura, já estava em meus planos a possibilidade de correr uma maratona fora do Brasil. Creio que este seja um sonho para qualquer maratonista.
E em meu caso, a primeira oportunidade veio quando eu faria uma viagem a trabalho para a Alemanha e vi que ela coincidiria com a maratona de Frankfurt.
Não tive dúvidas e fiz minha inscrição, pois eu teria que permanecer ali por perto durante aquele final de semana, indo no domingo à noite num voo de Frankfurt para Genebra.
Dessa vez eu estava melhor preparado, então as expectativas de conseguir um bom tempo de prova em um percurso praticamente plano, aumentaram minhas expectativas.
Porém. talvez por ser uma experiência nova, a qual trazia um significado especial para mim, senti uma certa preocupação antecipada de que algo não corresse bem, conforme eu havia planejado.
Eram possibilidades remotas de problemas que incluíam desde o cancelamento da viagem, alguma lesão antes do desafio ou outro contratempo qualquer. Naquele momento, deduzi com certa indignação que aquilo acontecia comigo pela primeira vez.
Um fato interessante é que eu já havia identificado tal sensação em outras pessoas e, com assertividade, a diagnosticava como um sintoma do conhecido “Medo de ser feliz”.
Porém, agora o problema estava comigo e confesso que precisei de alguma concentração adicional para que não atrapalhasse o alcance de meu objetivo naquele momento.
No final das contas, tudo correu bem. Fiz o percurso sem contratempos e, se minha meta era correr abaixo de 4 horas e meia, cruzei a linha de chegada em 4 horas e vinte e sete minutos, ainda conhecendo um pouco mais de uma cidade adorável.
Foi uma emoção diferenciada, principalmente porque um novo e distinto tipo de superação fora vivenciado.
Hoje, consigo olhar para trás e ver que, embora não tivesse percebido antes, senti este mesmo tipo de medo desnecessário em diversas outras ocasiões durante minha vida.
Antes de contar um exemplo garimpado em minhas próprias vivências e ressaltando que se trata de algo que nunca aconteceu comigo, imagino o que passa pela cabeça de alguém quando se torna o ganhador solitário de um prêmio acumulado, uma grande bolada, em alguma loteria qualquer.
Após a natural empolgação inicial, e também após os primeiros contatos com as novidades que causam impactos tão absurdos ao estilo de vida do ganhador, já ouvi histórias em que alguns dos ganhadores, a partir de algum momento, começam a sentir medo do que poderá lhes acontecer como contrapartida do inesperado benefício recebido.
É certo que o ser humano se adapta a tudo, principalmente se as mudanças são para melhor, como nesse caso. Por outro lado, apesar da maioria elevar seu patamar de vida em todos os níveis, são comuns os casos de pessoas que não se adaptam à nova situação e perdem tudo o que ganharam, além de vida pacata e feliz que possuíam antes.
Em uma escala incomparavelmente menor, houve um momento em que uma sensação similar me ocorreu. Contradizendo todos os prognósticos, eu recebi a confirmação de que havia sido promovido para uma posição executiva na empresa em que trabalhava. Era uma situação bastante improvável, pois eu ocupava um cargo dois níveis abaixo de minha nova posição e isso nunca havia ocorrido antes, pelo menos era o que todos falavam.
Mas o fato é que eu iria assumir uma responsabilidade muito grande e, por conhecer plenamente seu alcance, nem tive a chance de me empolgar.
Tendo meus pés fincados no chão desde o momento inicial, sendo bastante realista perante os desafios que iria enfrentar e com o suporte total de meu antecessor, pude desenvolver um planejamento adequado, o que me ajudou muito a partir do momento de posse no novo cargo.
Mas agora, após tanto tempo, consigo discernir muito bem os momentos em que não consegui evitar algum deslumbramento pelo poder, deveras limitado, e também dos momentos em que ingenuamente não percebi e não filtrei alguns falsos afagos.
Confesso que nesses momentos, apesar da oportunidade e da confiança que recebi, tive medo de não alcançar o sucesso e fracassar.
Não que o processo todo que se seguiu tenha sido fácil, pois enfrentei diversas situações bem difíceis. Mas, reconheço que pessoas muito importantes em minha carreira fizeram muito mais por mim do que precisariam fazer. Além disso, muitas das competências que acredito possuir hoje, somente se desenvolveram graças aos apertos pelos quais passei. Por isso, tenho apenas motivos para agradecer e sei que venci esta etapa de minha vida.
Hoje, com a sensibilidade aguçada por tão rica experiência, consigo às vezes, perceber alguma insegurança em jovens profissionais que temem o sucesso e, se protegendo dele, criam seus próprios argumentos para não vencer, impõem a si mesmos, certas dificuldades ou bloqueios para justificar antecipadamente suas limitações quase sempre imaginárias e, até mesmo, eventuais futuros fracassos.
Nesses casos, gosto de compartilhar com eles um ensinamento que um dia alguém generosamente me deu e que diz assim:
“Se algo muito bom acontecer graças à sua “boa sorte”, muito além de suas expectativas, agradeça com sinceridade e se comprometa em transferir uma parcela dos benefícios recebidos em prol de causas que valham a pena e ajude outras pessoas. Ou seja, retribua e amplie seu legado.”
Uma sensação de leveza e energia tomará conta de você e, assim como eu, você nunca terá medo de ser feliz.
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